Por * Diana C. 23/12/2008 - 17:25
Cabelos compridos e jeito feminino. Estas podem ser, mas não necessariamente, as características de uma mulher ou de um homossexual. Agora, acrescente as palavras personalidade ou identidade feminina. Aí, a conversa toma outro rumo.
Raquel completou recentemente 24 anos, mas somente há três se sente completa. Antes se considerava diferente, com um detalhe a mais: o pênis.
Quando nasceu, D** foi levado por sua mãe ao psicólogo. A busca por uma possível explicação e a queixa ao médico era de que, ao sair das fraldas, seu garoto, ao invés de urinar em pé como qualquer outro, insistia em fazer xixi sentado. Como era de se esperar, o médico afirmou que se tratava de uma criança normal e sadia. Porém, não era um menino somente com traços femininos e sim uma menina em um corpo masculino.
A partir desta consulta, Raquel conta que sua mãe passou a deixá-la mais livre para que aos poucos fosse se encontrando. "Meu cabelo sempre foi comprido, eu não usava roupas masculinas. Evitava só saia e vestido, mas de resto usava tudo", relembra.
Vista como uma menina, Raquel não enfrentou grandes preconceitos na infância. Porém, vivia uma crise interna que nem ela mesma entendia. E, aos sete anos de idade, Raquel tentou, em um momento desesperado, livrar-se de algo que acreditava não lhe pertencer. "Cheguei a tentar cortar o pênis, não queria aquilo", pensava. Duas cicatrizes deixadas com uma faca fez com que Raquel nunca mais se esquecesse deste dia.
Com 14 anos, em casa, ao mexer nas coisas de seus tios, Raquel achou uma revista que mudou completamente seu modo de pensar. A Playboy da transexual Roberta Close, edição de Maio de 1984, fez com que ela iniciasse a verdadeira busca por sua identidade de gênero. Como quem é da casa reconhece os parentes, Raquel viu entre as duas uma semelhança, que constatou ser verdadeira após as explicações de seus familiares sobre quem era a modelo da revista. Foi aí que Raquel decidiu: "é isso que eu quero."
Pesquisando cada vez mais sobre o assunto e as possíveis cirurgias, com 16 anos descobriu os hormônios e começou a tomá-los. Seu corpo foi tomando forma e, por ser alta e magra, Raquel começou a trabalhar como modelo feminino em eventos e desfiles.
Foi em um destes eventos que Raquel conheceu o médico responsável por sua cirurgia. "Como médico, ele me viu e percebeu que havia alguma coisa errada. Começamos a conversar sobre uma possível cirurgia". Nesse momento Raquel não teve dúvida. Iria, finalmente, se encontrar e viver como uma mulher completa.
Acertados os detalhes para a cirurgia de mudança de sexo, aos 17 anos Raquel começou a passar pela bateria de exames pré-operatórios, tanto psicológicos como físicos. "Os médicos constataram que até a minha estrutura óssea era feminina e a parte que cabe a mulheres no cérebro, a memória fotográfica, eu possuía de forma predominante".
Tudo finalizado na questão dos exames, assim que completou a maioridade, Raquel estava pronta para colocar em prática seu grande sonho. Porém, a dificuldade para achar um hospital gabaritado para este tipo de cirurgia em São Paulo retardou em dois anos seu desejo. E, com 20 anos, cansada de procurar algo em São Paulo, resolveu e partiu sozinha para Porto Alegre,"onde meu médico tinha clínica, e decidi que faria lá mesmo a cirurgia". E fez.
No dia 24 de Abril de 2004, Raquel deu adeus ao passado e não só começou uma nova etapa em sua vida, como também aos 21 anos teve sua primeira relação sexual. "Demorei, pois sentia nojo e vergonha do meu próprio corpo, não conseguia ficar nua na frente de ninguém antes da cirurgia".
Antes da cirurgia, Raquel não pensava na alteração de seu nome de registro, o qual não quis que fosse divulgado. "Não me preocupava com o nome, minha única preocupação era meu corpo. Tanto é que só fui dar entrada ao processo de alteração [de nome] três anos depois da cirurgia", declarou.
Para se tornar Raquel Munhoz no documento de identidade, ela aguarda apenas um exame que é realizado pelo governo. "Assim que me chamarem faço o exame para que o juiz possa autorizar a alteração no documento", explica.
Desfilando e realizando shows em casas noturnas, Raquel define seu momento como uma "Nova fase... Adeus ao passado" e finaliza dizendo que "agora sim, olho no espelho e vejo meu reflexo".
* Matéria originalmente publicada na edição 13# da revista A Capa (Maio/08)
** A pedido de Raquel seu nome de registro foi preservado.
A matéria original pode ser lida no site A Capa, clicando aqui.
.
.
Hmmm, que cantinho gostoso, Louise, parabéns pela iniciativa, mais um referencial para quem quiser se aprofundar mais na cultura CD e Ts. O mundo precisa mesmo se informar mais e infelizmente as publicações retiram do ar as matérias esclarecedoras que publicam sobre esses dois universos, taí a importância de mantê-las aqui. Já o pus na minha lista de blogues recomendados. Bjs!
ResponderExcluirP.S.: o blogue já começa o ano com o pé direito. ;)
ResponderExcluirOi Adriana, obrigada pelos comentários. E sim, creio que começamos bem o ano. Bjus, Louise.
ResponderExcluir